sexta-feira, 25 de agosto de 2017

Cidade Nova

(Luiz Magalhães)

Eu quero uma cidade limpa
Uma cidade iluminada e iluminista
Uma cidade branca, na qual o preto do cinza
Fora devidamente destituído de seu bel-devir

Uma cidade sem exageros, comedida, cordial e cortês
Quero habitar um lugar insípido e inodoro, como a água com flúor
Translúcida, para ver do outro lado
Que ligue ponto-a-ponto, a ponto de desligar-me
Uma cidade em que só se fala o essencial: despoluída sonoramente
Eu quero uma cidade reluzente, esfregada com água sanitária
Uma cidade cômoda e confortável
Onde não há disputas
Da onde eu não possa te ver
Eu quero uma cidade aprazível, aconchegante
Mais plumas de ganso do que asfaltos
Eu quero uma cidade que parou, que me empedra
Eu quero é morar num paraíso!
Quero cânticos que afofem meus ouvidos
Que se encontrem em consonância com a minha vontade
Aquela mesma: estagnada em si
Eu quero uma utopia distante
Que não me dê trabalho a curto-médio-longo prazo
Um não-lugar não-possível de talhar
De rachar
Habitado por uma humanidade incorruptível
Eu quero uma cidade que me ensurdeça
Com seu silêncio tom pastel
Eu quero a paz e a felicidade mórbida daqueles
Que passam a vida filtrando a água do aquário
E que morreram bebendo água oxigenada